Poemas da obra "A Noite de Luvas Brancas" de Mário Gerson
Mário Gerson - Brasil
Suor
No suor
Do teu corpo
Me refaço,
E em pedaços,
No teu
Dorso,
Me revolvo
Sobre a epiderme
Manchada
De saudade.
Decepção
Nunca saberei destroçarOs homens que me acenam
Em plena rua...
Nunca saberei se por detrás
Daquele rosto morará meu outro rosto.
Também não saberei para que cometa
Arrastaram-me os sentidos...
As discussões,
Os dilúvios de amor,
As fortalezas sozinhas.
Da luz, apenas guardarei
A lembrança de sua claridade.
Do homem que me acenou –
O braço levantado ante o mundo –
E da vida, que se vai aos poucos,
E que é já gasta,
Levarei a lembrança
Daquele dia sem luz.
Encruzilhada
Para Mário de Andrade
Meu destinoTambém era trágico,
E o desafio de ser fera
Entre os homens
Me perseguia,
Até que um dia
Eu topei comigo.
Interior
O Poeta
Que morre em mim
Traz a marca do silêncio
Que encontro em ti.
Ele caminha, disfarçadamente,
Entre os sentidos
Absurdos
Do seu coração.
Mas na luta diária de meu lado
Esquer
Ele se perde
Entre teu olhar no meu olhar.
Olhar-te, porém, do alto de meu
Disfarce,
Me constrange e me abala
Ou me perfura a carne,
Meu sangue
Banhando
De morte
As calçadas
Alheias –
Os olhares alheios;
Os homens alheios;
As mulheres alheias.
O Poeta que mora em mim
Também se ofende e se agrada.
É ser, como as aves entre os seres.
E eu, que me mapeio
O coração,
Ando perdido,
Canto a canto,
Em teus lençóis;
Em teus espantos!
Esse meu Eu Poeta
Que sangra, distante,
Outros meus amigos;
Esse meu Eu Poeta
Feito de dor e carne e vestígios;
Esse meu Eu Poeta
Que vê além
De meus ouvires,
Me cobre de desafios e
Pensares...
O pensar ser além
Do homem-Carne;
O pensar ser além
Do homem-Método;
O pensar ser além
Do homem-Máquina,
Me funde em pensamentos;
Me algema em faces
Estranhas
E vivas,
Feito água
No céu
De minha boca.
Mas as palavras
Me atiram fora
O corpo nu;
O corpo do Homem-Natural
Que me obriga,
Do desperdício
Que me custou
Rasgar esse meu tédio
Sobre a cidade,
À implosão de outros
Versos;
De outros estranhos versos
Escritos na sombra daquela
Imagem.
Mário Gerson
Nasceu em Mossoró, RN, Brasil. Possui as seguintes obras publicadas: O Suspiro do Inimigo (Contos), A Morte do Pescador (Novela), A Noite de Luvas Brancas (Poemas), O Catador de Espumas (Poemas).
Os poemas publicadas na Literatas fazem parte de seu livro A Noite de Luvas Brancas, publicado neste mês de abril, pela Editora Queima-Bucha.